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A responsabilidade civil no uso de patinetes elétricos

As empresas fornecedoras de patinetes elétricos respondem pelos danos advindos da ausência de informações sobre os riscos.

A inserção das bicicletas e dos patinetes elétricos compartilhados nas metrópoles brasileiras se intensifica em ritmo exponencial, representando uma alternativa aos meios de transporte convencionais.

1. A polêmica do uso de patinetes elétricos nas grandes cidades

Uma pesquisa desenvolvida pelo Procon/SP demonstrou que 80,38% dos paulistanos acham o patinete elétrico uma boa alternativa de transporte na Capital. Embora a grande maioria apoie o uso, apenas 28,02% o fazem sem ressalvas, ao passo que 71,98% considera indispensável uma regulamentação que indique locais específicos para transitar e o uso de equipamentos de segurança.

O tema ganha relevância e divide opiniões sobretudo quando remete aos acidentes causados ou sofridos pelos usuários. Como exemplo, destaca-se o primeiro episódio de vítima fatal decorrente de acidente com patinetes elétricos: em 08 de setembro de 2019, um empresário de Belo Horizonte veio à óbito após sofrer uma queda do referido modal. Segundo testemunhas, a vítima bateu a cabeça em um bloco de concreto usado para separar a ciclovia e não resistiu aos ferimentos.

A despeito da legislação de trânsito e da regulamentação que cada município poderá adotar, muito se questiona acerca da responsabilidade civil pelos danos decorrentes do uso de patinetes elétricos compartilhados. Importante salientar que após episódios como o de Belo Horizonte, a tendência do Poder Público é ofertar opções restritivas e implementar intervenções severas, na tentativa de conter um sentimento de impunidade geral.


2. As possíveis defesas jurídicas das vítimas de acidentes com patinetes elétricos

Sendo evidente a relação de consumo entre o usuário do aplicativo (destinatário final) e a provedora dos patinetes elétricos (fornecedora no mercado de serviços), o Código de Defesa do Consumidor parece nos prestar respostas satisfatórias. Nesse sentido, dispõe o artigo 8º da legislação consumerista que os serviços colocados no mercado não acarretarão riscos à saúde dos consumidores, exceto aqueles normais em decorrência de sua fruição.

 Em complemento à parte final do dispositivo anterior, o artigo 9º assevera que o fornecedor de serviços potencialmente nocivos à segurança deverá informar da maneira ostensiva a periculosidade latente.

Aqui falham todas as empresas fornecedoras do uso do patinete elétrico. O dever da informação ostensiva não se concretiza. Apenas se transferem ao usuário, via contrato de adesão (click agreement) o dever de observar todas as regas de segurança estabelecidas na legislação e o dever de não tomar atitudes de risco durante a condução do patinete elétrico (cláusula 5, alíneas k e l, dos Termos de Uso de uma das empresas do ramo).

Soma-se a isso a responsabilidade objetiva da fornecedora por informações insuficientes ou inadequadas sobre os riscos na fruição do serviço, inserta no artigo 14, caput, do CDC. Por outro lado, é certo que em casos de culpa exclusiva da vítima, a responsabilidade da fornecedora sobre o fato é afastada.

Porém, a exigência de um agir não-culposo somente poderá ser feita se o usuário conhecer o modo adequado de condução, bem como os riscos enfrentados, e, mesmo assim, optar pela ignorância. Do contrário, não há qualquer elemento subjetivo no agir que lhe transfira a responsabilidade.

Resumidamente, partindo-se da legislação consumerista, sobretudo da responsabilidade independente de culpa por fato dos serviços, entende-se que subsiste à fornecedora de patinetes elétricos o dever de indenizar os danos decorrentes do uso, ainda que indevido, dos patinetes elétricos. Se a fornecedora não presta informações ostensivas sobre os perigos no uso do equipamento, tampouco orienta o modo adequado de uso, o consumidor não pode arcar pela ausência de instrução.


Na presente coluna quis suscitar questão da responsabilidade civil pelo uso de patinetes elétricos para fins de contribuir com o debate, sem pretensão de se fazer inequívoca. Agradeço ao leitor e me disponho a continuar a conversa pelo e-mail gustavo@martinelliguimaraes.com.br.


[1]http://www.procon.sp.gov.br/pdf/Relat%C3%B3rio%20Pesquisa%20Patinete%20El%C3%A9trico.pdf

[2] https://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2019/09/08/interna_gerais,1083451/morre-homem-que-caiu-de-patinete-eletrica-em-belo-horizonte.shtml

Sócio-fundador da Martinelli & Guimarães Advocacia. Head das áreas de contencioso cível, Imobiliário, Terceiro Setor e Relações Governamentais. Mestrando em Direito Econômico pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Paraná. Membro do Núcleo de Pesquisas em Políticas Públicas e Desenvolvimento Humano (NUPED).

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