A chamada taxa rosa (do inglês – pink tax), não é uma espécie de tributo, mas consiste na diferença de valores cobrados por um mesmo produto, a depender do público ao qual ele é direcionado.
O Consumer Affairs (DCA), da cidade de Nova York [1], conduziu um estudo sobre os preços de um mesmo item, destinado a gêneros diferentes. É importante destacar que o conceito de gênero presente na pesquisa é binário, isto é, masculino e feminino.
A agência comparou mais de 800 produtos em diversos setores, entre eles: brinquedos e acessórios, roupas infantis e para adultos, produtos de higiene pessoal e produtos de saúde domiciliar voltado aos idosos, de 90 marcas diferentes. O intuito era demonstrar a linha temporal de um consumidor médio, refletindo o ciclo econômico de todas as idades.
As conclusões são sensíveis. O resultado mostrou que as mulheres saem em desvantagem, tendo o acréscimo de 7% no valor dos produtos comercializados, em face do público masculino. O impacto financeiro ao longo dos anos é imensurável.
Pesquisa similiar foi conduzida no Brasil pelo Professor da ESPM Dr. Fábio Mariano [2]. Os principais setores analisados no estudo foram os de vestuário para bebês, higiene pessoal, serviços, alimentação e brinquedos.
Se no primeiro estudo a conclusão foi de que existe um acréscimo de 7% no valor de um mesmo produto para do público feminino, a realidade no Brasil é ainda mais impactante, podendo chegar a 12.3%. A distinção começa desde cedo, de modo que as roupas para meninas com até 3 anos de idade chegam a ser 23% mais caras, e os brinquedos até 26% do que os destinados aos meninos.
Na ocasião da pesquisa, foram entrevistadas 480 mulheres de três capitais brasileiras, abrangendo todas as classes sociais. Quase 90% das entrevistadas acham normal que o preço seja mais elevado, tendo em vista que as mulheres são consideradas mais consumistas. Em suma maioria, não há tentativas de negociação dos valores ou reclamações. Constata-se, por fim, uma unanimidade: 97% das entrevistadas afirmam que é mais caro “ser mulher”.
Segundo o Professor Fábio Mariano, idealizador do estudo, o argumento de que as mulheres são “mais consumistas” não condiz com a realidade, pois, em sua opinião, se as mulheres fossem de fato propensas a adquirir mais bens, esse deveria ser um dos motivos para que os preços fossem menores.
Por outro lado, as empresas arguem que a motivação por trás desta discrepância é de que os produtos destinados ao gênero feminino possuem características próprias, tornando-os naturalmente mais caros. Entretanto, todas as mercadorias analisadas possuem as mesmas características, e, por consequência, o mesmo custo, valendo notar que alguma chegam até a serem idênticas.
Existe algum amparo pelo Código de Defesa do Consumidor?
Não existe uma legislação específica a respeito deste assunto. Contudo, no próprio CDC em seu artigo 39, incisos V e X [3], é vedado ao fornecedor exigir do consumidor vantagem excessiva, como também elevar o preço dos produtos sem justa causa. É possível aplicar a inteligência deste dispositivo ao caso em tela.
Ao tratar da Política Nacional de Relações de Consumo, o artigo 4, inciso VI, do CDC, versa a respeito da repressão de todos os abusos praticados no mercado de consumo que possam causar prejuízos aos consumidores.
Apesar de não haver um dispositivo direcionado especificamente ao “custo rosa”, podemos encontrar no Código de Defesa do Consumidor uma salvaguarda que, em leitura ampliativa, nos permite interpretar a ilegalidade desta prática.
Ocorre que o sobrepreço de produtos voltados ao público feminino ainda é pouco conhecida e quase nunca divulgada, razão pela qual passa despercebida pela sociedade.
Conclusão
Em um país no qual ainda existe uma diferenciação manifesta entre gêneros, tanto em questão salarial quanto de direitos, o quadro aqui demonstrado assume contornos de normalidade. No entanto, conforme demonstrado pelos estudos realizados, não há justificativa para a distinção de preços observada.
Nesta esteira, tal postura assumida por fornecedores, baseada apenas em gênero, configura, de certo modo, mais um mecanismo impeditivo de igualdade social entre homens e mulheres. Tem-se uma estrutura social na qual a mulher já recebe menos, por razão única de seu gênero, e, ainda assim, gasta mais para adquirir os mesmos produtos que os homens.
Nesse cenário, tem-se uma redução considerável do poder aquisitivo das mulheres, uma vez que gastam mais e recebem menos. Isso representa o quanto ainda se está longe de uma equivalência material entre os gêneros. Resta evidente a necessidade não só da mudança regulatória que vise a garantia de equidade, mas também a reestruturação social, em especial do pensamento das mulheres, no sentido de não normatizar tais padrões e começar a contestá-los.
Referências Bibliográficas
[1] https://www1.nyc.gov/site/dca/partners/gender-pricing-study.page
[2] https://static.poder360.com.br/2018/07/TAXA-ROSA-GENERO-1.pdf
[3] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078compilado.htm
Bacharel em Direito pelo UNICURITIBA.
Pós-graduanda em Cannabis Medicinal e Direito.
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Nicole Duartehttps://martinelliguimaraes.com.br/author/nicole-duarte/
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